domingo, 27 de julho de 2008

"O Reino" de Gonçalo M. Tavares

Os quatro livros sucedem-se no mesmo tempo. As personagens encontram-se entre livros. No entanto vivem de forma diferente esse tempo. Para uns é um tempo de guerra, para outros é tempo de loucura ou de poder. “A Máquina de Joseph Walser” a personagem faz uma colecção muito peculiar, peças metálicas que não ultrapassam os dez centímetros. Walser está convencido que é indiferente aos acontecimentos exteriores, apenas é importante a sua colecção que se encontra dentro de pequenas caixas e de qual anota todas as características, procedências e medidas. No entanto W. descobre um dia, ao recolher uma peça de uma arma, que está a interferir no mundo, porque impede um soldado com a sua arma incompleta de matar um outro ser humano. Mais coisas sucedem-se. Gonçalo M Tavares é dono de uma narrativa única e peculiar, de um mundo minucioso.
No “Aprender a rezar na Era da Técnica” conta-nos a vida de um médico que resolve, com atropelos, iniciar uma carreira política, vai-se assim apoderando das coisas e das pessoas. Começa a dominar a técnica de poder, para esta personagem a guerra passa-lhe quase ao lado “O que espantava mais Buchmann era como o medo e a velocidade, a determinada altura, se misturavam, deixando de ser possível apontar alternadamente para um e para outro. Estava-se já perante uma nova substância - como o hidrogénio e o oxigénio na molécula de água - substância (medo/velocidade) mais explosiva que dinamite.
Ou, talvez com mais exactidão: o grande rastilho do mundo, pois essa mistura não era ainda a explosão mas o trajecto que terminaria na grande explosão. Seremos tanto mais fortes, dizia Buchmann a Kestner nas suas conversas sobre estratégia, quanto mais conseguirmos infiltrar na população esta mistura: movimento rápido e temor. Não deixar parar para que não deixem de ter medo. Não deixar de os amedrontar para que não parem.”
No “Um Homem: Klaus Klump” a personagem que mais sofre com a guerra nós paramos em muitos parágrafos para saborear: “Alof era robusto, era um homem musculado. Como tocava instrumentos com esses músculos e com essa força! Alof dizia: Quando toco música esforço-me para diminuir a força que tenho.”

5 comentários:

Caçadora de Emoções disse...

Ainda não tive a oportunidade de ler um livro de Gonçalo M. Tavares. Um dia destes, não vou deixar de o fazer...
Mas, tive o privilégio de o ouvir falar de si e dos seus livros num Curso de Escrita Criativa do El Corte Inglés, com o Zé Couto Nogueira. E, a imagem que me ficou marcou-me pela positiva.

Um abraço,

Paulo Ventura disse...

Sou um admirador confesso do Gonçalo M. Tavares. Não deixe de ler também o conjunto de livros "o Bairro" constituídos por pequenas narrativas sempre em torno de um personagem. São livros deliciosos e que sentimos pena que acabem tão depressa.
Abraço,
Paulo

Tiago Carvalho disse...

Caro Paulo Ventura
Já li quase todos do "Bairro", faltam-me dois, são excepcionais. Gonçalo M. Tavares esteve numa escola de Aveiro há algum tempo e disse que com o bairro queria construir uma espécie de aldeia do Asterix, mas de escritores, intelectuais, que lutam contra a Barbárie em vez de ser contra os Romanos. Há outros livros dele que me agradaram muito: Histórias Falsas e Investigações Geométricas e que coloquei no meu blogue um excerto
http://geometricasnet.wordpress.com/2008/03/13/goncalo-m-tavares-investigacoes-geometricas/
Um abraço
Tiago Carvalho

Paulo Ventura disse...

Caro Tiago,
A descrição que o Gonçalo M. Tavares fez da "construção" do bairro é deliciosa e faz muito sentido.
Esta nossa comunidade virtual tem muitos encantos, um deles é o de nos ir proporcionar descobertas mútuas. Não conhecia o livro que mencionou e fui consultar o seu blogue. Fiquei seduzido claro e vou já tentar comprar.
Abraço,
Paulo

Indigente disse...

Gonçalo M Tavares tem o dom de escrever as maiores barbaridades literárias, e sobretudo científicas e filosóficas, sem que ninguém as percebe porque, infelizmente, os conhecimentos de ciência e filosofia dos leitores não é nenhum. Daí que se valorize tanto um autor que está para a literatura como o Zé Cabra esteve para a música. Triste literatura