quinta-feira, 11 de agosto de 2011
O SENTIDO DO MUNDO
"Uma das maiores satisfações da minha vida não me foi dada pelos livros que escrevi mas pelos livros que editei"
Isto afirmava Ricardo Menéndez Salmón, escritor e editor, num artigo publicado pela Babélia há cerca de um ano.
Dizia Borges que precisava de duas vidas: uma para ler e outra para escrever. E Menéndez acrescenta um terceiro caminho, o da edição, "...que integra o melhor de ambos os mundos e ensina, como uma imperecível lição de humildade, que bela, necessária e nobre continua a ser esta velha arte de dotar o mundo de sentido através da palavra."
Vem isto a propósito do meu amigo João Rodrigues, editor da Sextante. Ele edita livros de que gosta e fala deles com um entusiasmo que nos obriga a ir lê-los depressa.
Falei-lhe do escritor italiano Erri de Luca e do encanto que tive a ler "O peso da borboleta" de que já aqui falei. O João disse-me que o mais impressionante livro de de Luca era "Três cavalos" e tinha-o ele editado na Biblioteca Âmbar de Bolso de que foi editor e onde publicou alguns notáveis autores.
A colecção acabou. Os seus livrinhos encontram-se por vezes nalgumas feiras do livro a preço de saldo ou mais baixo ainda.
Preparei-me para me fazer ao caminho em busca de "Os três cavalos" quando, inesperadamente, o encontrei no fundo de uma das pilhas dos livros que tenho para ler nos próximos meses, ou anos, ou...
Atirei-me a ele. E foi emocionante. De Luca é um escritor raro. Um poeta. Porque o seu trabalho não é apenas contar uma história. O seu trabalho é reinventar o mundo, encontrar novos caminhos para o entender, para o nomear através do ofício das palavras.
A história é a de um ex-militante político que, por amor a uma mulher depois assassinada, torna-se combatente contra a ditadura dos generais na Argentina.
Depois de uma longa fuga de anos, regressa ao sul de Itália onde se torna jardineiro.
Tem em Salim, emigrante africano, um amigo sólido, um homem como ele, um irmão como se verá no final. Muito entre eles passa pelo não dito ou, melhor, pelas metáforas secas e duras. E tudo também assim: acção e linguagem agarradas ao chão, à busca de um outro sentido para o mundo.
O tempo narrativo é sempre o presente, mesmo o que já aconteceu há 20 anos. se passa à volta das árvores, das ervas, da terra, das azeitonas, do café, do vinho.
O narrador reencontra o amor numa prostituta. Um amor também contido, feito de toques, de cheiros, de geometrias cuidadosas. E messe amor se cruza a sua história de combatente. E tudo regressa ao presente ou talvez nunca daí tenha saído.
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