História das ciências (1)
A História das Ciências encontra-se sempre ligeiramente atrasada em relação à História dos Desejos.
Há metáforas famosas, peguemos nelas.
É como se os cavalos fossem o Desejo e a carroça puxada por eles a ciência.
Se os cavalos se separarem da carroça ganharão velocidade, mas perderão utilidade pública; a sociedade quer funções e não fugas.
Mas o pior sucede mesmo à carroça. Se os cavalos se separarem ela, ela não mais se moverá.
A 2ª matemática
Questão de Wittgenstein:
“Se todos os homens acreditarem que 2 x 2=5, 2 x 2 será ainda igual a 4?”
Existe uma 2ª matemática atrás da primeira. É feita daquilo que é Erro na primeira, e é ainda - como a primeira matemática - feita de ordem e regras. Os erros da 2ª Matemática são também proposições incontestáveis na 1ª Matemática.
(Pensar nos opostos. No mal e no bem. Na exactidão e na falha. No alto e no baixo.)
Gonçalo M. Tavares
Gonçalo M. Tavares é um dos mais interessantes e originais jovens escritores portugueses: tem ideias, escreve com clareza e precisão, é prolífico e a sua obra é de qualidade homogénea e incontestável. Outra característica marcante dos textos de Gonçalo M. Tavares é a capacidade de obrigar o leitor a procurar continuamente o equilíbrio dos seus pontos de referência através do confronto com as ideias e conceitos expressos nos seus estimulantes textos.
Em Breves Notas sobre ciência (2006), Gonçalo M. Tavares, o autor de Jerusalém (2004), Histórias falsas (2005), Canções Mexicanas (2011) e de muitos outros textos de interesse, procura aparentemente dissecar alguns dos pressupostos subjacentes ao trabalho científico. Digo-o aparentemente, porque apesar de as suas reflexões aparentarem ser, pela sua natureza e por conta da linguagem utilizada, de cunho epistemológico, elas o são só à primeira vista. De facto, nestas notas, impostas ao autor pelo seu interesse pela ciência, o ambiente discursivo científico-filosófico não passa de um engenhoso artifício para produzir um ensaio, escrito na forma de aforismos, sobre o método de abordar factos e o seu escopo, sobre a identidade do investigador e de seus estados de alma, sobre o objecto de estudo e a sua génese, sobre o amor, a verdade e o erro.
Diz-nos Gonçalo M. Tavares:
«Céptico como os cépticos, crente como os crentes. A metade que avança é crente, a metade que confirma é céptica. Mas o cientista perfeito é também jardineiro: acredita que a beleza é conhecimento.»
Certamente, já o sabíamos desde Voltaire, e longe de dizer que o fazer científico não tem uma componente de crença e estética, mas há que se dizer que a beleza é um guia secundário para o investigador, embora seja, em oposição, a pulsão mais básica do artista.
E também há no texto de Gonçalo M. Tavares um marcado interesse em focar o discurso nos equívocos inerentes aos procedimentos de busca das “verdades” e nos erros que o processo comporta. Mas, há muito a ciência não presume verdades acerca dos fenómenos e factos, mas se restringe a fazer hipóteses que servem, precária e temporariamente, como teorias. E nenhum cientista poderia afirmar que estas hipóteses são fruto exclusivo de factos puros e ideias com componentes estritamente científicas.
Mas Gonçalo M. Tavares, não está interessado nas ciências, mas na literatura que se pode produzir tomando a ciência como pretexto. E sob este ponto de vista, estas Breves Notas sobre ciência propiciam, sem qualquer dúvida, uma leitura extremamente estimulante.
2 comentários:
meus deus! salvai-nos!
Tanta ignorância que aqui vai. Epistemologia não é a filosofia da ciência, mas teoria do conhecimento.
“Epistemologia: (do grego episteme, “conhecimento”, e logos, “explicação”) o estudo da natureza do conhecimento e da justificação; especificamente, o estudo (a) das características da definição, (b) das condições essenciais das fontes, e (c) dos limites do conhecimento e da sua justificação. As três últimas categorias são representadas pelqa tradicional controvérsia filosófica sobre a análise do conhecimento e da sua justificação, as fontes do conhecimento e a sua justificação (por exemplo, racionalismo versus empirismo) e a viabilidade do ceticismo a respeito do conhecimento e da sua justificação.” ,por James A. Montmarquet, “Epistemologia”, in Dicionário de Filosofia de Cambridge, (org. Robert Audi), Paulus Editora, 2º edição, 2011, p. 269.
“Epistemologia, s. Teoria do Conhecimento; o ramo da filosofia que investiga a natureza e a possibilidade do conhecimento. A epistemologia trata também do alcance e dos limites do conhecimento humano, e do modo como este é adquirido e retido. Investiga ainda algumas noções correlatas como, por exemplo, perceção, memória, prova, indício crença e certeza. Por Alan White, “Epistemologia” in Dicionário e Filosofia, (Direção de Thomas Mautner), Edições 70, 2010, p. 255.
Ainda:
“Epistemologia (gr. Epistêmê, conhecimento) Teoria do Conhecimento. Algumas das suas questões centrais são: a origem do conhecimento; o lugar da experiência e da razão na génese do conhecimento; a relação entre o conhecimento e a certeza e entre o conhecimento e a impossibilidade de erro; a possibilidade do ceptiscismo universal; e as formas do conhecimento das novas conceptualizações do mundo.” Simon Blackburn, Gradiva, 2º edição, 2007, p. 132.
Em livros de introdução à teoria do conhecimento (epistemologia):
Numa recente tradução de uma introdução à teoria do conhecimento, com o mesmo título, Introdução à Teoria do Conhecimento, Dan O’Brien, Gradiva, 2013, na parte 1 intitulada Teoria do Conhecimento, secção 1. Epistemologia, o autor começa assim:
“A teoria do conhecimento levanta certas questões muito amplas e profundas acerca dos sujeitos de conhecimento e do conhecimento em si. O que é conhecer? Como distinguir o conhecimento da mera crença? E será o conhecimento possível? A teoria do conhecimento é também designada epistemologia, a partir da palavra grega para conhecimento, episteme.” p. 21.
Numa introdução por parte da professora portuguesa Maria Luísa Couto Soares (O que é o Conhecimento, introdução à epistemologia, Campo das Letras, 1º edição, 2004), creio que docente na Universidade Nova de Lisboa, diz assim: “Epistemologia: poderia definir-se, neste sentido como o estudo da justificação da crença ou opinião. “Quais as crenças que são justificadas ou fundamentadas e quais não o são?”, “Qual a diferença entre conhecer verdadeiramente e ter uma mera crença ou opinião verdadeira?”, “Qual a relação entre crer e conhecer?”, “Porque é que pensamos ou cremos que p?” – seriam perguntas centrais da epistemologia.” p. 9.
Além dos dicionários e livros mencionados, existe em Portugal também outra tradução de uma introdução à epistemologia, por parte de um dos melhores epistemólogos contemporâneos: Epistemologia Contemporânea, Jonathan Dancy, Edições 70, 2002.
Podem encontrar-se vários artigos sobre epistemologia no sítio Critica na Rede, onde se encontram vários artigos sobre a mesma, inclusive este também de Jonathan Dancy, extraído do Oxford Companion to Philosophy, org. por Ted Honderich (Oxford: Oxford University Press, 1995, pp. 809-812):
http://criticanarede.com/fil_epistemologia.html
ainda este texto de Michael Williams retirado de Problems of Knowledge: A Critical Introduction to Epistemology (Oxford: Oxford University Press, 2001), pp. 1-5.
http://criticanarede.com/fil_queeaepist.html
No mesmo sítio, este ainda sobre o que é conhecimento, retirado do livro Core Questions in Philosophy, de Elliott Sober (Prentice Hall, 2008)
http://criticanarede.com/fil_conhecimento.html
Para onde vai a literatura portuguesa quando se interpreta Gonçalo M. Tavares como grande filósofo e grande escritor, quando não é uma coisa nem a outra.
Tudo isto resulta de uma má formação científica, literária e filosófica, e bem assim da formatação pós-modernistas. O que se escreve aqui sobre as notas do Tavares demonstra bem ao estado a que chegamos.
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