quinta-feira, 27 de maio de 2010
A LEITORA REAL
A ASA teve uma excepcional colecção de livros intitulada "Colecção Pequenos Prazeres". Aí deu a conhecer em língua portuguesa alguns autores e obras de imenso relevo. Luís Sepúlveda aportou a Portugal nessa colecção. E lembro-me de outros: OLivier Rolin, Mário Aparaguín, Carlos María Dominguez, Patrick Modiano, Lars Gustafsson, Agotha Kristof... E por ali passaram muitos outros, de Graham Greene a João Aguiar, de Milan Kundera a Somerset Maugham.
Eram livrinhos simpáticos, transportáveis, fáceis de ler em qualquer sítio.
Livros dessa colecção encontram-se agora aí pelas prateleiras de pequenas livrarias mais espertas e atentas aos livros e à literatura. Ou então, nas feiras do livro a preço baixo que vão brotando por estações de metro ou de comboio.
Dessa colecção bebi avidamente muitos livros. Um deles foi "Só lhes deixaram a roupa que vestiam..." de um autor inglês, Alan Benett. Era uma delícia de ironia, humor muito inglês e arte de bem contar uma história.
Pois apareceu nas bancas há pouco tempo mais um livrinho de Alan Benett. Peguei nele e só o deixei quando acabei de o ler.
A Rainha de Inglaterra entra pela primeira vez numa biblioteca itinerante (um bibliomóvel) parado nas traseiras do palácio e sente-se na real obrigação de levar um livro para a escolha do qual pede a sugestão a um moço de cozinha que é um furiosíssimo leitor.
A partir daí a Rainha transforma-se numa leitora avassaladora. Devido a este vício ou devoção, vai-se descurando nalgumas das suas reais obrigações pra se dedicar aos encantos e inquietações que a leitura lhe proporciona.
O humoré uma constante. Senão, veja-se:
"Nessa note, ao passar pelo quarto dela, agarrado à botija de água quente, o Duque ouviu-a rir alto. Passou a cebeça pela abertura da porta: - Tudo bem, cara amiga?
- Claro. estou a ler.
- Outra vez? - E for-se embora a abanar a cabeça."
A leitura da Rainha torna-se motivo de vários aborrecimentos e confusões não só para o pessoal da Corte como para o primeiro-ministro e leva até que se pense que ela está com Alzheimer.
O próprio Presidente da França fica sem saber o que dizer quando, numa recepção oficial, a Rainha lhe pergunta a sua opinião sobre Jean Genet (escritor que ele nem conhecia).
Da leitura, a Rainha chega à escrita e conclui da necessidade de "ter uma voz". E cnclui que só se tem voz quando se escreve.
E mais não conto. Mas garanto que é de ler e chorar por mais.
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