quarta-feira, 21 de setembro de 2011

CONTOS DE JOSÉ CARDOSO PIRES, 30/40 ANOS DEPOIS - UM COMENTÁRIO APENAS


Há 30/40 anos, li, pela primeira vez, um livro de José Cardoso Pires, “Jogos de Azar”. E voltei a lê- lo há pouco, agora numa edição da Leya, de 2011. É uma colectânea de onze contos, recolhidos de dois livros do autor, publicados nos anos 50 e nos anos 60 do século passado. Dessa primeira leitura guardo uma memória precisa: era algo de novo, que me impressionou bastante, tanto pela forma como pelo conteúdo. Essa primeira impressão foi corroborada e ampliada pela leitura de outras obras do autor: “Balada da Praia dos Cães, “Alexandra Alpha”, por exemplo.
Por isso, foi com curiosidade que iniciei a releitura dos “Jogos de Azar”. Os contos nele incluídos teriam resistido aos efeitos de um dos tempos mais cruéis que conheço, o tempo literário? A resposta não é clara: por um lado, sim; por outro, não. Sim, pela beleza da escrita, feita de rigor, imaginação e criatividade. Não, pelos temas tratados. Temas que , de um modo geral, podemos situar no âmbito de um “neo-realismo urbano”, em voga nos meados do século XX e que já pouco nos diz nestes primeiros anos do século XXI. “Amanhã se Deus quiser”, “ Dom Quixote, as Velhas Viúvas e a Rapariga dos Fósforos”, “ Ritual dos Pequenos Vampiros” são alguns dos exemplos do que acabo de dizer. Em todos eles, a mestria da escrita e da construção da história atinge um fulgor extremamente raro na nossa ficção literária da segunda metade do século XX ( e não me estou a esquecer de Saramago nem de Lobo Antunes). Mas neles também se notam as marcas de um neo-realismo social característico de certos meios urbanos, em que a miséria e a morbidez dos ambientes e dos que neles vivem contrastam com a pureza, a ingenuidade de certas personagens que neles dificilmente vão sobrevivendo.

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