Da genial filósofa Hannah Arendt (1906 – 1975), autora do monumental estudo “As Origens do Totalitarismo” de 1951, do controverso “Eichmann em Jerusalém: um relatório sobre a banalidade do mal” (1963), a “Crise da Cultura” (1972), entre tantos outros títulos, este surpreendente opúsculo de 1968, que impressiona pela lucidez da análise e pela actualidade do tema.
A problemática é-nos introduzida sem ambiguidades:
"O objecto destas reflexões é um lugar comum. Nunca ninguém teve dúvidas que a verdade e a politica estão em bastante más relações, e ninguém, tanto quanto saiba, contou alguma vez a boa fé no número da virtudes politicas. As mentiras foram sempre consideradas como instrumentos necessários e legítimos, não apenas na profissão de politico ou demagogo, mas também na de homem de estado. Por que será assim? E o que isso significa no que refere à natureza e à dignidade do domínio político, por um lado, e à natureza e à dignidade da verdade e da boa-fé, por outro? Será da própria essência da verdade ser impotente e da própria essência do poder enganar. E que espécie de realidade possui a verdade se não tem poder no domínio público, o qual, mais do que qualquer outra esfera da vida humana, garante a realidade da existência aos homens que nascem e morrem - que dizer, seres que sabem que surgiram de não-ser e que voltarão para aí depois de um breve momento? Finalmente, a verdade impotente não será tão desprezível como o poder despreocupado com a verdade?”
Reflexões que suscitam a inevitável pergunta: Estão os políticos comprometidos com a mentira como estão os filósofos com a verdade? Esta e outras questões relacionadas com a manipulação da verdade factual, prática comum nos regimes totalitários, são brilhantemente discutidas neste breve ensaio. Uma preciosidade. E muito útil nos dias que correm.
Orfeu B.
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