quarta-feira, 8 de maio de 2013
À BEIRA DA LIBERDADE
grande História é feita de muitas pequenas histórias.
Falamos do 25 de Abril, da maravilhosa chegada da liberdade, da festa de podermos falar abertamente uns com os outros, de nos abraçarmos e de sonharmos por vezes de formas abstrusas e delirantes, mas também esses delírios faziam parte da descoberta de um país que estava há 48 anos debaixo do ferro da ditadura. Da memória desses dias faz parte também o momento em que se abrem as portas das prisões onde imperava a tortura e o medo.
A História tudo isso vai registando com imagens, textos, análises.
Mas, a Joana Pereira Bastos não é historiadora, é jornalista. Está interessada nas pequenas histórias de que é feita a grande História. Histórias pessoais de alguns homens e mulheres que foram presos poucos meses ou poucas semanas antes do 25 de Abril e encerrados em Caxias numa altura em que a repressão se intensificava porque também a resistência crescia a olhos vistos.
A autora priveligia a emoção no seu processo narrativo. O lá por dentro dos que sofreram a tortura e depois se calaram porque muitos deles ainda hoje têm pesadelos, insónias, alterações psíquicas permanentes que os fazem tentar calar e esquecer a extrema dureza de uma polícia, a PIDE, que foi muitíssimo eficaz na destruição das pessoas que agrediu, torturou e humilhou.
É o documento humano que nos arrasta num apaixonante entretecer de dados factuais e relatos pessoais. A descrição das torturas, estátua, sono, agressões brutais. Documento precioso. Eu que o diga. Podia lá ter estado nesses dias. Companheiros meus por lá passaram. Vários dos presos de que o livro fala são amigos queridos. Nuno Teotónio Pereira, Conceição Moita, Luís Moita, José Manuel Tengarrinha... Tremi ao conhecer a história deles, o terror por que viveram, as dores que tiveram, as angústias por que passaram.
Poderia aqui trazer um sem número de pormenores mas recordo dois momentos que me emocionaram de forma diferente.
Durante o dia 25 de Abril, eles souberam que tinha havido uma revolução. Mas continuavam fechados e vários deles pensaram que podia tratar-se de um golpe de extrema-direita, uma "pinochetada". Durante a noite de 25 para 26 vários se prepararam mentalmente para enfrentar o fuzilamento. E só no fim do dia 26, já madrugada de 27, é que os portões se abriram para um tempo novo e tão esperado.
Outro momento, uma narrativa notável de um ex-preso que anos depois entra num restaurante e dá com o PIDE que o torturara a almoçar com a família. Vai ao carro buscar uma pistola para o matar. Quando regressa ao restaurante o PIDE já se tinha ido embora.
A democracia e a liberdade acabaram com as grades mas não com as dores e essas é bom que fiquem guardadas na nemória.
Obrigado Joana.
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