domingo, 6 de abril de 2014

CREIO NAS PALAVRAS TRANSPARENTES



(Desenho de António Ramos Rosa)

Abril é mês de poesia. Já foi Poesia na Rua. Há 40 anos. Agora a poesia já não está na rua. Resiste no coração de alguns.

O meu filho João foi visitar a namorada a Lyon e enviou-me uma mensagem a dizer que, visto de fora, Portugal é neste momento muito pouquinho.

Este pouquinho quer dizer também que o país está entregue a aldrabões e uma parte significativa da população nem reage. São pequeninos, sem alma. Andam todos satisfeitos a ver se lhes calha um Audi na rifa. Uma miséria sem dignidade nem poesia, portanto.

Mas deixemo-nos de queixas e vamos ao livrinho que nos traz aqui.


Leio sempre com grande emoção a poesia de António Ramos Rosa. Porque muita dela me leva ao ponto mais alto e belo do que é a escrita poética.

Foi com particular emoção que li este grande livrinho . Julgo tratar-se do último conjunto de poemas antes de António Ramos Rosa morrer. A morte paira nos versos. Mas não vem desenhada num enredo de sombras e medos. Vem sim iluminada pelo amor à plenitude da vida que a palavra transpira e oferece a quem o lê

Estes poemas soltam em cada passo um fantástico e generosa oferta que o poeta coloca no prato de prata da palavra.

"Creio nas palavras
transparentes
que pertencem ao vento
ao sal
à latitude pura.

(...")

Ler Ramos Rosa exige entrar "num estado semelhante ao transe…” como se referia C.S. Lewis em “A experiência de ler”, à necessária atitude do leitor na relação com muita da poesia moderna.

Esse transe transporta-nos ao júbilo de uma luz dificilmente explicável pelas palavras do nosso pobre dia-a-dia

Suponho que este pequeno grande livro inaugura a recente colecção de poesia Meia Lua da Editora Lua de Marfim, que conta com publicações de Amadeu Baptista, Casimiro de Brito e Graça Pires.

Num tempo de ausência de poesia da vida e dos livros é uma alegria ver um editor que se atira em frente e se põe a semear estrela para o futuro Bem hajas, paulo.


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