segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009
“JOKOB VON UNDEN”
Um livro e uma escrita fascinantes e que me levantaram e continuam a levantar muitíssimas questões.
O livro começa assim:
“Aprende-se muito pouco aqui, há falta de professores, e nós, rapazes do Instituto Benjamenta, nunca seremos ninguém, por outras palavras, nas nossas vidas futuras seremos apenas coisas pequenas e subalternas.”
Logo esta abertura nos agarra e, no entanto, o Instituto Benjamenta, escola mínima, disciplinadora e aparentemente bafienta, constituirá apenas um cenário de fundo para as reflexões de Jakob Von Gunten.
Walser leva-nos a percorrer uma narrativa quase sem nada para narrar. Apenas alguns episódios pouco importantes. O fundamental é o carrossel dos pensamentos de Jakob. Um delicioso e contraditório filosofar em terra de ninguém, um habitar apenas o delírio da linguagem, um vaivém entre o fantástico devaneio e a súbita consciência do talvez inútil empolamento desse devaneio.
Carregado de uma ironia muito germânica, Jakob passeia longamente nos seus pensamentos entre natureza e cultura. Uma velha contradição, aparente ou real, em torno da ideia de que existir como um ser da natureza não exige mais nenhum desejo senão o gozo da própria existência. Mas esta simples afirmação já se inscreve no campo dos actos de cultura. E é neste campo quase puro que se movimenta Jakob Von Guten, ou melhor, o seu autor Robert Walser.
Jakob existe, obedece e não quer ser nada, não quer ver além de… E no, entanto, não faz outra coisa que não seja deixar-nos pistas mais ou menos obscuras e labirínticas para esse desdobramento da língua e da sua festa de sentidos.
Ao ler Walser vieram-me muitas vezes à memória os poemas de Fernando Pessoa e, sobretudo, os do “Guardador de Rebanhos” de Alberto Caeiro, na sua recusa da transcendência simbólica das linguagens.
Há, aliás, um espírito de época atravessa Walser. O seu processo de escrita, o desenho do personagem central e a forma como ele olha o mundo exterior a si e como se olha a si próprio, tem óbvios paralelos com Kafka, Jaroslav Hasek e possivelmente com Musil, embora talvez não conhecessem as obras uns dos outros.
(Acabei por ler algures que Kafka conheceu e apreciou algumas das obras de Walser).
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2 comentários:
Sua crítica me deixou muito instigada a ler esse autor que ainda não conheço!
No Brasil o livro só saiu neste ano. Esperava muito dele, depois de ter lido O Ajudante. Mas achei o livro muito sombrio, sem o humor e a ironia que sobravam a Joseph Marti, personagem de O Ajudante. Prefiro este livro a Jacob von Gunten, apesar de suas qualidades.
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