De vários quadrantes, chega-nos notícia do ressurgimento de um género literário que esteve em declínio durante as últimas décadas do século XX, ou seja, o conto. Ressurgimento que se tem feito sentir tanto em Espanha como em França. E, por arrastamento, em Portugal, como se comprova pelas traduções que vários editores vêm publicando. De referir será, ainda, o aparecimento de novos contistas portugueses, nomeadamente em 2008. De tal situação, tenho dado testemunho em algumas crónicas deste blogue.
A que se deve a ressurreição do conto? O que leva as casas editoras a integrar livros de contos nos seus catálogos? Algum cansaço dos leitores dos romances “peso-pesados”, de 500/600 páginas? A constatação de que o conto (pela sua pouca extensão, concisão, intensidade e dinamismo da acção) corresponde ao ritmo da vida actual? É possível que estas sejam algumas das razões, estas e algumas mais.
A “Babélia”, suplemento cultural de “El País”, traz, num dos seus últimos números, um dossiê sobre o tema, em que sobressaem alguns artigos, nos quais se analisa o que se está a passar em países de língua espanhola. Note-se que os países de língua espanhola da América do Sul e Central sempre deram primazia ao conto, à novela curta. Países em que os contitas alcançaram a fama que só aos romancistas era concedida noutros países, incluindo a própria Espanha (veja-se o caso de Borges, Cortázar, Onetti).
Além das razões apontadas para o florescimento do conto, algumas mais são referidas no dossiê da “Babélia”. A internet e a blogosfera, pela sua natureza, são veículos privilegiados para a sua difusão. Por outro lado, as pequenas editoras, de meios financeiros limitados e necessidade de encontrarem novos nichos de mercado, têm contribuído para o aparecimento de novos contistas ou para a reedição de obras clássicas, caídas no domínio público. Esta tendência é acompanhada por uma orientação livreira, que concede espaços para livros de contos ou que privilegia este género literário – o caso mais evidente é a livraria “Três Rosas Amarillas” (nome que é uma homenagem ao conto de Carver, que narra o último dia de vida de Chekov), em Madrid, exclusivamente dedicada aos contos.
As características do conto actual exprimem, mais do que o romance, muito do que é o homem do século XXI. É isso que nos diz o escritor espanhol Juan Eduardo Zuniga: “A precisão, a intensidade e o vertiginoso, que caracterizam o conto de hoje, adequam-se ao leitor apressado, até porque a história narrada é imediata. Talvez esta rapidez do conto reflicta hoje o fraccionamento e a rotura de âmbito psicológico do homem actual”. Interessante será ainda referir que muitos contos são escritos num ritmo frenético, que é o ritmo da nossa vida. Contos escritos num arrebatamento que se apodera do seu autor e que não o deixa fazer mais nada enquanto não termina o seu escrito. Contos a que Cortázar, que conhecia bem este estado de exaltação criadora, chama “contos contra-relogio”. Contra-relógio como a nossa vida quotidiana…
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