sexta-feira, 14 de novembro de 2008

VINTE ANOS E UM DIA



Outro livro que anda por aí a ser vendido a preço muito baixo.

Semprún é um escritor da memória, a memória dos campos de concetração nazi, a memória da militância política contra o franquismo, a memória do que da Guerra Civil restou em Espanha .

Este romance fez-me tremer. Fala de uma Espanha feita de sangue, de sexo e morte,num extraordinário cruzamento entre realidade, ou memória de uma realidade, e ficção.

Sem que quase nada se passe à superfície,tudo ferve para lás das aparências num caleidoscópio de momentos sempre tensos e acontecimentos que se atropelam, sobrepõem, recuam e avançam com notável mestria.

A filosofia e a pintura movem-se a par da trama sexual, marcada por uma linha de transgressão voyeurista que avança e recua numa estranha relação a três.

Mas não é só isto. Não é só a historieta passada nos anos 50 que Semprún nos dá. Conta-nos um ritual de morte imposto pelos latifundiários aos camponieses e conduz-nos à procura das quase secretas razões que o mantém vivo como celebração dos vencedores da Guerra e humilhação dos vencidos.

E faz uma autêntica chicuelina ao revelar que o narrador, personagem e testemunha dos factos narrados é Frederico Sanchez, seu nome de guerra real enquanto dirigente comunista nos anos 50 em Espanha. E revela-nos como teceu a ficção a partir de um quadro barroco de uma pintora napolitana.

E em poucas palavras é difícil falar de toda a riqueza de uma trama excepcionalmente dura e, em simultaneo, inquietantemente apelativa.

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