Haiku em Portugal, haikai no Brasil, para designar a mesma forma poética, que remonta ao século XII, no Japão, e que, a partir do século XIX, se estende por diversos países e influencia diferentes culturas literárias. Em Portugal, tem tido cultores de nomeada, como Venceslau de Morais e Camilo Pessanha, em finais do século XIX, inícios de XX, e, na actualidade, Eugénio de Andrade, Albano Martins, Casimiro de Brito, Herberto Helder.
Estes e outros dados vêm expressos na “Apresentação” que o poeta David Rodrigues faz do seu livro “Estações Sentidas – 111 Haiku”, publicado na editora Indícios de Oiro, em 2007. Ainda segundo o mesmo autor, “talvez a sedução do haiku seja o seu carácter conciso. Ainda que sem uma fórmula rígida, espera-se que o haiku tenha aproximadamente cinco sílabas no primeiro verso, sete no segundo e, de novo, cinco no terceiro”. Segundo o poeta brasileiro Paulo Franchetti, “haikai não é síntese, no sentido de dizer o máximo com o mínimo de palavras. É antes a arte de, com o máximo, dizer o suficiente”. Um mínimo que se expressa, como dissemos, numa composição de três versos, que, segundo a tradição japonesa, tem por tema a Natureza, os seus ciclos, as suas múltiplas expressões.
Com o decorrer dos anos, a temática do natural foi dando lugar a outras temáticas, alargando-se às mais variadas manifestações humanas e sociais.
Ora, estas considerações vêm a propósito de uma nova obra de David Rodrigues, publicada em finais de 2008, na editora Corpos: “Respirar – 101 haiku”. “A nossa vida – diz-nos David Rodrigues – passa-se entre uma inspiração e uma expiração. Desde a primeira vez que inspiramos o ar do mundo, repetimos durante toda a vida este movimento vital pelo menos dez vezes por minuto. O último acto da nossa vida é uma expiração, como que devolvendo ao mundo o ar que lhe inspirámos quando nascemos”. Assim, o livro divide-se, fundamentalmente, em dois grandes capítulos: “Inspirar” e “Expirar”. No primeiro, agrupam-se, segundo o autor, formas mais tradicionais, cujo sentido está, “grosso modo”, sintetizado na expressão “da Natureza para mim”. Citemos alguns exemplos:
“como mão de amigo
o Sol de Inverno
amorna os ombros”
ou:
“inspiro com a Terra
quando o vento atravessa
os carvalhos”
ou, ainda:
“no Carnaval
a amendoeira vestiu-se
de neve”
No segundo capítulo, “Expirar”, agrupam-se textos de forte centração no autor e cujo sentido se poderá condensar na frase: “de mim para a Natureza”. Eis alguns exemplos:
“como cascas de árvore
as memórias flutuam
nas ondas da música”
ou:
“quando o Sol
entra em casa pela manhã
saio à sua procura”
David Rodrigues acrescenta um último capítulo, que denominou de “Transpirar”, no qual integra poemas de carácter jocoso e erótico, como é o que a seguir se transcreve:
“não há palavras
que segurem os meus olhos –
caem para o teu peito”
Estamos, pois, perante um poeta de nítida inspiração lírica, que se expressa de uma forma original e que revela uma consciência literária que não é habitual entre os nossos poetas. A divisão do seu livro nos três capítulos que mencionei é prova provada do que afirmei e denuncia uma postura reflexiva e crítica sobre a sua própria escrita, o que não é, de modo algum, um dos seus méritos menores.
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