quarta-feira, 14 de agosto de 2013
A REALIDADE E O IMAGINÁRIO
Talvez seja no policial e no thriller que se torna necessário melhor dominar a arte de contar uma história, o ritmo, o encadeamento, o arco narrativo (senão veja-se o que Jorge Luís Borges disse àcerca deste tema).
Neste tipo de literatura, o escrito procura transmitir a realidade como ela é ou como ela poderia ser e procura fazê-lo de forma a agarrar no leitor e não o deixar levantar os olhos até à última página.
Neste tipo de romance é por vezes deixada para trás a arte das palavras que nos leva ao fundo do conhecimento das coisas, dos sentimentos, da busca de uma sentido para a nossa tão precária condição humana
A verdade, entretanto, é que há quem busque justamente aquela literatura que lhe ofereça sobretudo o real, a informação, o momento único, a reportagem em livro, os actos do actor que passou à História como grande Imperador ou General.
Há também os que buscam os livros que se propõem revelar segredos, mistérios e conjuras que se escondem por trás das aparências da realidade, quer eles sejam mais palpáveis ou mais fantasiosos.
Há ainda muitos que buscam distracção e a informação e que se recusam aos livros que os façam mergulhar na grande aventura da imaginação que a palavra pode oferecer.
Sabemos que há muitas formas de ler e muitos tipos de leitor. Porventura os livros são criados tanto pelos leitores como pelos escritores. Porque cabe ao litor levar o entendimento do trabalho do escritor até ao mais fundo possível. O problema é apenas quando o escritor tem pouco fundo no seu trabalho.
Há vários tipos de escritores, também. Uns que procuram servir melhor, outros que servem pior os leitores que os buscam. Os qse dirigem a leitores mais exigentes e os que se dirigem a leitores menos exigentes. Há escritores que mergulham nos complexos corredores da alma humana. Há os que falam de viagens, os que tecem a sua escrita em torno do debate de ideias, os que querem apenas contar histórias e que o fazem com arte e talento,os que trabalham a realidade e os que navegam nos delírios da fantasia
Um thriller como "A FILHA DO PAPA" tem um motivo forte que atrai os seus leitores. Trata-se de uma espécie de promessa implícita de que ali serão revelados segredos muito especiais e escondidos. Assim, quem parte para a leitura leva o desejo de afastar a cortina e espreitar aquilo que ainda não tinha sido revelado e a que só alguns poucos especialistas ou iniciados têm acesso.
Este não revelado pode ter noutros casos um carácter fantasioso e servido por uma escrita pouco inventiva que roda em torno de lugares comuns através de personagens sem carne nem alma.
Aqui, temos a certeza de que que Luís Miguel Rocha, ex-jornalista, se tornou efectivamente num especialista sobre assuntos do Vaticano. Daí que as revelações contidas em "A filha do Papa" não sejam fantasiosas. Rodam em torno da figura controversa do Papa Pio XII, da sua relação com o nazismo e a questão judia e com o funcionamento do banco do Vaticano. Abrem um pouco a cortina sobre a figura de Madre Pasqualina, companheira de PIO XII durante quase toda a sua vida, a cradora da ideia do banco do Vaticano e única mulher na História que esteve presente num Conclave para a escolha de um novo Papa.
Entre vários momentos da vida de Pio XII e a actualidade, Luís Miguel Rocha mergulha no mundo tremendo das intrigas, lutas e crimes que, ao que parece, têm sido o pão nosso de cada dia no Vaticano, levando os seus heróis de outros romances, o padre Rafael e a jornalista Sarah, a envolverem-se numa teia de crimes e mistérios no centro do mundo negro e prevertido do Vaticano. E a propósito disso mesmo, Frei Bento Domingues, na sua coluna dominical no Público, referia-se ao Papa Bento XVI como "O grande teólogo que parecia saber muito dos mistérios de Deus e confessou que os mistérios do Vaticano o ultrapassavam".
Assim, misturando investigação, realidade e ficção, Luís Miguel Rocha constrói as suas histórias. E constrói-as bem, de acordo com os bons modelos do género. Pegamos no livro e não o queremos largar. Avidamente vamos de capítulo em capítulo, através de uma teia de crimes, mistérios, segredos e personagens que procuram descobrir aquilo a que se possa chamar a verdade e sobreviver a uma terrível máquina económica e administrativa que domina o Vaticano
"A Filha do Papa" desenvolve um imaginário de crimes e aventuras solidamente ancorado numa realidade muito bem documentada.
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