Quando li o livro de contos “Um bom homem é difícil de encontrar” da Flannery O’Connor, (numa edição da D. Quixote, já lá vão uns bons anos) foi como se tivesse sido arrancado com violência da cadeira e arremessado de encontro a uma parede. A crueza, o dramatismo e a ferocidade dos personagens e situações deixaram-me perplexo e fascinado. A editora Cavalo de Ferro tem vindo a editar os livros da Flannery O’Connor a um bom ritmo (alguns deles já anteriormente publicados por outras editoras).
O livro que agora li, foi “O céu é dos violentos”. O livro começa com a morte de Mason Tarwarter. Este irado e fanático personagem, numa linha ténue entre a loucura e a religiosidade, define um profeta como alguém que só pode esperar o pior da sua existência terrena. A vida de Mason Tarwarter, ele próprio profeta nesta vertente muito peculiar, está marcada por infelicidade, loucura e violência. A citação de S. Mateus, que dá título ao romance, é inteiramente apropriada, já que é intenção de Flannery O’Connor demonstrar que o espírito inspirador de S. João Baptista pode também inflamar um rude camponês sulista: “Desde os dias de João Baptista até agora, o reino dos céus tem sido objecto de violência e os violentos apoderaram-se dele à força”. Mason Tarwarter é o tio-avõ de Francis Tarwarter, um adolescente de catorze anos. Mason educou o sobrinho num universo de confrontações dramáticas, devendo o rapaz esperar a infelicidade a loucura e a violência. Quando o seu tio-avõ morre, Francis tenta renegar a herança pesada e não cumpre o pedido do tio-avõ: ser enterrado – Mason acaba por ser enterrado com a ajuda de um negro, mas Francis pega fogo à propriedade rural onde viviam. Francis vai então ter com o seu tio Rayber e o filho deste, Bishop, uma criança diminuída mental. Está implícito no livro que um Rayber supostamente são, simbolizando o senso comum de pés agarrados à terra, está destinado a viver numa enorme escuridão. Os aparentemente transtornados Tarwarter são, para Flannery O’Connor, mais aceitáveis que Rayber, e Francis rapidamente descobre que o peso da herança do seu tio-avõ se sobrepõe à sua nova vida secular. Estas convicções religiosas de Flannery O’Connor podem parecer desconcertantes e estranhas. Mas o mais importante é que ela sabe contar uma história. Não é necessário partilhar as suas convicções para nos encantarmos com este livro.
1 comentário:
Deixou me bastante curiosa . Gostei da forma como descreve intensamente, passo a passo, cada detalhe. Delicioso.
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