quinta-feira, 16 de julho de 2009

LAURENT GAUDÉ, UM CONTISTA CHEIO DE VIRTUDES





Laurent Gaudé é um escritor francês, relativamente jovem, que publicou vários romances e alguns contos. Contos que a ASA editou sob o título “Noite Dentro, Moçambique e Outras Narrativas”. Quatro histórias, abordando diversos temas, em contextos diferentes. De entre essas quatro histórias, destacarei a primeira, “Sangue Negreiro”, não só pelo tema, mas também pelo modo como é tratado.
No porto de Saint-Malo, um escravo negro foge do navio em que vinha e vagueia pelas ruas daquela cidade francesa. Cidade que se mobiliza para lhe dar caça, em cooperação com a tripulação do barco. Como não se lhe consegue encontrar o rasto, a população entra em pânico, temendo que o fugitivo possa vir a cometer os crimes mais hediondos. Um medo antigo, feito de irracionalidade, que se intensifica e alastra quando começam a aparecer, pregados nas portas das casas das pessoas gradas da terra, dedos ensanguentados de um negro. O oficial, que exerce as funções de capitão do veleiro de que se escapuliu o negro, sente-se responsável pela situação e crê que as gentes da cidade assim o consideram. E que o olham com desconfiança e hostilidade, o que lhe provoca uma forte insegurança – e um medo crescente. O que o leva ao enlouquecimento, lento mas inexorável. Numa linguagem nervosa e eivada de humanidade, mas primando pela obediência a um cânone clássico, Laurent Gaudé descreve com rigor e profundidade as grandes emoções das multidões e nelas enquadra os sentimentos e as acções dos indivíduos que com elas interagem (ou nelas se incluem). Sempre dentro de um clima de mistério, a roçar o sobrenatural. Enfim, um exemplo de um bom conto, simultaneamente clássico e moderno. E, acima de tudo, muito bem escrito.









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