domingo, 5 de julho de 2009
O RISO AMARGO
Senti-me repartido ao acabar de ler este livro. Terrivelmente divertido. Comicamente incómodo. O autor fez-me rir mas rapidamente fez com que o riso se tornasse muito amargo.
Com um ritmo preciso e meticuloso, uma escrita eficaz, Adiga traça o retrato radical, absurdo e doloroso de uma Índia contraditória, miserável, tradicionalista, avançada tecnologicamente, progredindo às cavalitas do capitalismo ultra-liberal assente na corrupção a níveis quase impensáveis.
O protagonista é um escroque que sobe da miséria absoluta a pequeno empresário através da sabujice, do assassínio, da corrupção, e que se orgulha dos seus crimes e da sua miséria moral.
A estratégia é divertida e foi utilizada de forma superior por Hazek com o seu valente soldado Shweik. Mas aí, o que nos fazia identificar-nos com o soldado era a sua humanidade e o facto de dirigir todas as suas “maldades” contra o poder. Aqui, e ao contrário do que diz a propaganda (ou alguma crítica) não cheguei a experimentar qualquer simpatia pelo protagonista. É repelente desde o início. E o livro acaba por ser uma espécie de hino inverso à repelência.
Simultaneamente vi o filme “Quem quer ser bilionário” que dá uma ideia semelhante da Índia actual. Violência e miséria em todos os sentidos.
A diferença é que no filme há uma humanidade que ressalta de vários personagens (chamem-lhe demagogia, se quiserem, mas é humanidade) . Aqui não. Não há saída. E, o que mais me incomoda, fica uma suspeita de que o autor o escreveu numa estratégia em que se coloca a si própria num degrau acima da podridão do mundo. E assim, através da descrição obsessiva da miséria está a vender-se a si próprio como figura intocável. Boa para receber prémios… estarei a ser injusto?
Este é o primeiro livro de Aravind Adiga e a escrita é uma maratona. Vamos ver, daqui a 10 ou 15 “kilómetros”, onde é que ele andará.
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