domingo, 5 de dezembro de 2010

POETAS NOSSOS IRMÃOS



Luís García Montero é um poeta granadino cujos poemeas encontrei na deriva por jornais e sites em busca de novos poetas, quer dizer, poetas que eu não conheça ainda.

Pelos 5 continentes há muitas vozes poéticas que é lamentável não chegarmos a conhecer. As nossas editoras deixaram de arriscar e publicar novas e antigas vozes da poesia do mundo. E é pena.

Lembro o espanto com que na adolescência descobri Neruda, Ferlinghetti, Voznessenski, Ungaretti nos velhos Cadernos de Poesia da D. Quixoite, Szymborska na Relógio d'Água, Tarkovski ou Tonino Guerra na Assírio & Alvim, e tantos, tantos outros poetas que estas duas editoras e algumas outras como a Campo das Letras publicaram.

Diz-se que a poesia não se vende. Não sei se é verdade. Sei que é também por isso que temos uma crise. A falta de poesia cria um grande buraco onde a incompetência e a corrupção fazem ninho facilmente.

Encontrei um poema de Montero num suplemento cultural de um jornal espanhol. Achei que um homem que escrevia assim tinha de ser meu irmão. É um poeta da emoção e dos valores , talvez afastado da frieza ética e cognitiva onde trabalham muitas das artes plásticas e alguma da literatura do pós-modernas.

Resolvi traduzi-lo e tentar verter para português a música e a emoção das suas palavras.

Fica a tradução do poema e a notícia do livro "VISTA CANSADA" de onde ele saiu.



OS FILHOS



Por favor, não tragam ruído
à tranquilidade deste poema
escrito com a mão
do que fecha a porta ao apagar
a luz.
Os meus três filhos acabam de adormecer.
Necessito de silêncio para pensar
neles.


Cores indeléveis num lápis
de traçado infantil,
voltam a desenhar
- mas desta vez a sério –
uma árvore, uma casa, a memória
de uma luz acesa
com sabor a Dezembro,
os cristais do medo
e a ilusão do futuro
debaixo do sol dos dias…..

Um filho é o segundo país onde nas-
cemos.
Com a sua falta de idade faz-nos
repetir aniversários
e devolve-nos
ao mundo do relógio,
às chamadas telefónicas
que são uma raiz
na margem do tempo.

Um filho ensina-nos a perguntar
com voz de água
a verdade decisiva da terra.
Sermos como juncos, e em amor flexíveis,
não assegura respostas
nem confirma o repouso.

Elisa, Irene, Mauro,
cada qual com o seu porto e com a sua
chuva,
luzes cintilantes de um mesmo rio.
Ninguém revele, por favor,
que acabo de escrever-lhes um poema.
Os filhos crescem com espinhos.
Nunca sei imaginar o que podem dizer do que digo,
o que podem pensar do que
penso,
o que podem fazer com o que faço

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