O Tiago evocou aqui a Rosa Montero e o José no seu comentário evocou um belíssimo livro dela: A louca da casa. Nesse livro a autora faz uma distinção assaz interessante que aqui repesco. Ela divide os autores em memoriosos e amnésicos. Os primeiros são os nostálgicos do seu passado, aqueles que pensam ter perdido o paraíso em algum momento da infância e escrevem, diz ela, “para o tentar recuperar, para retomar aquilo que se foi, para lutar contra a decadência e o fim inexorável das coisas”.
Continuando com este raciocínio, e simplesmente agarrando noutros nomes, a autora alega o contrário: que outros escritores encontraram na literatura a forma de escapar do inferno ao qual a sua infância esteve submetida; adoptaram-na como um meio de construir para si próprios um lugar seguro para se refugiarem da ameaça exterior. Estes, continuo a citar Rosa Montero, são os autores amnésicos, os que “não querem ou não podem recordar; certamente fogem da sua própria infância e a sua memória é como um quadro mal apagado”. Para ela, mesmo as suas formas de escrever são diferentes. Os primeiros, como Tolstoi, “partilham um estilo literário mais descritivo, reminiscente, cheio de móveis, objectos e cenários carregados de significado para o autor e desenhados até ao mais pequeno detalhe porque se referem a coisas reais petreamente instaladas na recordação”. Os segundos, exemplificados por Conrad, “apesar de reproduzirem quase ponto por ponto uma experiência real do escritor, não têm nada a ver com o rememorativo e autobiográfico. Quando Conrad fala da selva, não está a descrever a selva do Congo belga, mas sim a selva como categoria absoluta e nem sequer isso, porque essa floresta enigmática e horrivelmente fértil representa a escuridão do mundo, a irracionalidade, o mal fascinante, a loucura”.
1 comentário:
Surgiu em Espanha um novo livro de Rosa Montero com um título interessante, li um pouco e parece-me muito bom - "Instrucciones para salvar el mundo"
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