Tenho vindo a descobrir, tardiamente mas com crescente entusiasmo, a colecção “Ovelha Negra” da Editora Oficina do Livro. Trata-se de uma colecção com muito bons livros latino-americanos. Acabei agora de ler um livro de contos dessa colecção que me deixou fascinadíssimo: Terra de Ninguém do mexicano Eduardo António Parra. Os contos situam-se na paisagem rural mexicana, na maior parte dos casos aldeias áridas e inclementes, mas também em paisagens urbanas do Norte do México e no El Dorado americano apenas sonhado, relatado ou entrevisto. Os personagens desses contos, os últimos entre os últimos da sociedade, estão entre os dois lados de uma linha/fronteira que dá o mote a cada conto: a linha entre o real e o fantástico/mágico; a normalidade aborrecida e a vida nas margens da sociedade feliz e trágica ao mesmo tempo; a marginalidade com moral e a corrupção; a ponte entre o México e os Estados Unidos que funciona como montra para contemplar de perto os sonhos; a modorra de uma aldeia isolada versus a turba pagã incendiada por temores ancestrais, etc.. Perpassa por estes contos a crueldade, a violência, a tragédia, mas também as contradições do ser humano. Aconselho a leitura ao som da banda americana Calexico, uma banda também ela da fronteira entre dois mundos e com a qual sentimos a aridez do México.
1 comentário:
Só há pouco tempo comecei a aproximar-me da literatura mexicana que tem grandes autores e momentos literários altíssimos.
Duas figuras ímpares são o Octávio Paz e o Carlos Fuentes.
A prosa do Carlos Fuentes é fortíssima, poética e apaixonante. Dele há várias coisas publicadas em português. Li "Velho gringo", um romance poderosíssimo numa tradução que deixa muito a desejar. Melhor ler em castelhano. Há também o filme com o Gregory Peck no papel do gringo, um jornalista corrupto que desiste de tudo e, para morrer, passa a fronteira e junta-se aos revolucionários zapatistas. O livro é fabuloso. O filme, não sei. Não vio e desconfio sempre das adapções cinematográficas de grandes livros. Ficam sempre aquém.
Li também "A fronteira de vidro" que tem a ver com este território de que fala Parra nos seus contos. Esta zona de passagem do Norte para o Sul onde se misturam culturas, fomes, raivas, violências, afectos por vezes levados ao extremo.
Do pouco que sei, há vários méxicos e vários méxicos literários. Este, o da fronteira é intenso, violento, e abrasador. Gosto muito.
Abraço,
JFanha
Enviar um comentário